Thursday, March 29, 2007

Coração Forasteiro

Foto retirada do site: http://www.paginadogaucho.com.br/hist/sulr-05.jpg
Homenagem a meu bisavô, tropeiro, Américo Lopes



Meu coração forasteiro apenas olha as estrelas do céu
São belas e pertencem a todos
A chuva que cai
Lavando a alma
Pertence a todos
O canto dos violeiros
Pertence a todos
A esperança
Pertence a todos
Meu coração, acabrunhado, chora...
Eu e meus exílios.
Minhas fugas e buscas....
Um dia irei a Pernambuco,
Aquele cantado por Miguel Carneiro.
Um dia serei Romeira e darei graças em Aparecida.
Por um milagre.
Por minha Fé.
Pelo Meu Coração.
Mas meu coração forasteiro só pede uma rede pra dormir.
Cinco minutos em frente ao mar.
Que viver requer paisagem.
Abraço.
Aperto de mão.
Vida, minha vida...
Aonde vais me levar?
Se cega, apenas tropeço e perdi os rumos de mim?
Estas ondas que escorrem de meus olhos e salgam minha boca.
São ondas da solidão que escolhi.
De um sonho perdido.
Um coração partido.
Seu moço violeiro, canta pra me levar ao jardim do paraíso.
Canta, que urgente preciso, voltar a sonhar.
Que agora apenas quero o colo de meu filho...
As preces de minha mãe.
O riso do meu irmão.
A força dos meus afetos.
Canta violeiro....
Minha alma poeta precisa de ilusão.

Brumado, 29 de março de 2007


Wednesday, March 28, 2007

A Mulher de Roxo

Foto retirada do site: http://flame.blogs.sapo.pt/arquivo/P1050119-2.jpg
Não achei nenhuma foto da Mulher de Roxo. Pesquisem.... Nossas lendaS são esferas de nossa vida.


Oswaldo Montenegro já cantou outra abordagem da solidão...
Eu que já fui só em meio a uma multidão, hoje procuro compreendê-la e dou mil vivas a Bill Gates. E assim, deletos alguns "amigos" e "adiciono" outros. Vida é reciclagem.
E no meio do barulhinho da TVE, até agora a única coisa que estou vendo prestar, fico imaginando a solidão dos que aprenderam a desligarem seus celulares, julgando eterno seu poder, risos...
Pobres mortais, nem de longe tangeciam a beleza da solidão da Mulher de Roxo. Aquela que eu tantas vezes vi, menina, pertinho da Slopper, na Rua Chile, aquela solidão mágica, impenetrável... Quase aristocrática. Aquilo é que era chique e que a ela se rendam as garotas Dancin days dos anos 70....
Aquilo é que era poder!
Agora deixar um celular na caixa, trocar um chip? Isso não é poder, é covardia...
A pinha pode ser uma boa metáfora. Quando de vez, sonhamos degustá-la madura. Impecável seu sabor. Porém se a gente por covardia, quer esperá-la bem mais madura para que seja mais doce, somos covardes e corremos um enorme risco de vê-la se patir. Quanto desperdício... Uma pinha, oásis da naturez partida, rachada, fragmentada em vários pedaços, sem sabor, sem função por pura covardia.

Votando à Mulher de Roxo eu a vi sim, várias vezes, Assim como toquei a mão de Irmã Dulce, quase alma gêmea de São Francico de Assis.

A mulher de roxo nada falava.

Não vi seu documentário, nada sei do seu fim. Só sei que sua solidão se vestia de roxo.

Aonde dormia?

Alguém deveria dar-lhe o que comer... Salvador é ainda terra de solidários. Sempre foi.

Mas hoje medito não sobre a solidão de catatônicos, de lendas ou de frutos do imaginário popular.

Medito acerca dos que chegaram ao poder e optaram à solidão pós-moderna de desligarem seus celulares, mudarem de operadoras ou trocarem seu chips. Por uma razão muito vil, deixar de atender a seus companheiros de jornada. Os que te levaram até aquilo que eles julgam poder...

Tão frágil isso quanto uma pinha madura demais. Em breve partida sem ser degustada.

Jamais entrarão na história, jamais serão lembrados, cairão nas vagas tristes dos ilustres temporários.

Que Caetano cante por mim:


Podres Poderes



Enquanto os homens exercem seus podres poderes
Motos e fuscas avançam os sinais vermelhos
E perdem os verdes somos uns boçais
Queria querer gritar setecentas mil vezesComo são lindos, como são lindos os burgueses
E os japoneses mas tudo é muito mais
Será que nunca faremos senão confirmar
Na incompetência da América católica
Que sempre precisará de ridículos tiranos?
Será, será que será que será que será
Será que esta minha estúpida retórica
Terá que soar, terá que se ouvir por mais zil anos?
Enquanto os homens exercem seus podres poderes
Índios e padres e bichas, negros e mulheres
E adolescentes fazem o carnaval
Queria querer cantar afinado com eles
Silenciar em respeito ao seu transe , num êxtase
Ser indecente mais tudo é muito mau
Ou então cada paisano e cada capataz
Com sua burrice fará jorrar sangue demais
Nos pantanais, nas cidades , caatingas e nos gerais
Será que apenas os hermetismos pascoais
E os tons e os mil tons, seus sons e seus dons geniais
Nos salvam, nos salvarão dessas trevas e nada mais?
Enquanto os homens exercem seus podres poderes
Morrer e matar de fome, de raiva e de sede
São tantas vezes gestos naturais
Eu quero aproximar o meu cantar vagabundo
Daqueles que velam pela alegria do mundo
Indo e mais fundo tins e bens e tais
Será que nunca faremos senão confirmarNa incompetência da América católica
Que sempre precisará de ridículos tiranos?
Será, será que será que será que será,
Será que essa minha estúpida retórica
Terá que soar, terá que se ouvir por mais zil anos?
(Solo Instrumental)
Ou então cada paisano e cada capataz
Com sua burrice fará jorrar sangue demais
Nos pantanais, nas cidades, caatingas e nos gerais
Será que apenas os hermetismos pascoais
E os tons e os mil tons, seus sons e seus dons geniais
Nos salvam, nos salvarão dessas trevas e nada mais?
Enquanto os homens exercem seus podres poderes
Morrer e matar de fome de raiva e de sede
São tantas vezes gestos naturais
Eu quero aproximar o meu cantar vagabundo
Daqueles que velam pela alegria do mundoIndo mais fundo
Tins e bens e taisIndo mais fundo
Tins e bens e taisIndo mais fundo
Tins e bens e tais...

Obrigada Caetano, sempre atual! E quando eu te canto, a Dinamarca inteira já apodreceu....

E viva a mulher de roxo. E Viva Tonho Matéria que cantou: Eu quero o poder pra poder amar.

Quanto a vcs que desligam seus celulares, o meu novo continua sempre disponível....
"O poder corrompe e o poder absoluto corrompe absolutamente"
Montesquieu

Thursday, March 22, 2007

A Menina e o Manacá


Lembro do portãozinho dos fundos e do pé de Manacá que me fazia sombra e me cobria de flor.Ficava quase em frente ao portãozinho. E eu sentada no reinado dos meus cinco anos tirava as botas e ali ficava, à sombra do Manacá, domando formigas e rolando com a cachorrada.

Era muito cachorro solto no quintal. Uns quinze. Bob e Dinga, os preferidos, parceiros e travávamos diálogos e estratégias para abrir o portãozinho e ganhar mundo da rua.

Era uma casa estranha com dois velhos com as feições de tristeza. A velhinha fazia farofa de couve, mas me sentava em frente à tv para ver Tom e Jerry. O velhinho comia banana amassada com um pouco de farinha, como sobremesa. E me dava goiabas. Ia à missa todos os dias cedinho pela manhã e tinha uma cara de medo. Não era um medo qualquer era um medo resignado. Um dia levaram a velhinha. Tempos depois o velhinho fugiu.

E a casa ficou só. Depois foi divida ao meio: um filho de cada lado. Como se a loucura admitisse cercas.

Eu não sabia que morreria o manacá, o portãozinho (meu ponto de fuga) viraria muro e a alegria de netos corendo, cachorrada latindo, flores nascendo nas jardineiras deixariam para sempre de existir.

Eu queria atravessar o muro do passado e retornar ao pé de manacá porque esta menininha ainda mora em mim e o portãozinho do fundo dava pra rua e eu até hoje não consegui fugir, tudo vive e martela no fosso da minha memória.

Fugir com a cachorrada pela rua seria minha redenção, mas o passado é assim uma quase raiz fincada pra sempre nalgum ponto da alma. Não há mais cachorrada, nem jovens sonhadores e sábios tomados por loucos, nem velhos com medo de falatório, nem filho predileto, nem portãozinho e nem manacá.

Ainda há a casa... Mas não há mais varandal, nem uma mulher que fazia farofa de couve e doce de leite e muito menos um manacá desabando flores e abafando dores.

Restou a menininha na alma da poeta, procurando portões por onde fugir e uma vaga idéia do que podia ser diferente.


Alyne Costa

Brumado, 22 de março de 2007

Monday, March 19, 2007

Eterno Menino

Meninos Soltando Papagaio - Portinari, 1947



Surge um canto novo
De todo terreiro um menino
Um pandeiro...
Um novo som sem luz néon
Menino tocador de reis
Menino tocador de boi
Menino tocador de flauta
Menino batedor de lata
Já foi cantada sua majestade
Hoje canto o infinito do seu sonho
E o menino abóia
O menino bóia na borda do sonho
Veleja oceanos em barcos de papéis
Meninos profetas e menestréis
Atravessas os ares com asas de papagaio
Voa, voa, voa, num céu infinito
Rala a perna, dá um grito
Puxa cabelo da colega de sala
Pirraça, pirraça e acha graça
Marcha, soldado, de papel o chapéu
Solta bombinha, anarquiza a quadrilha
Ri de tudo que não pode rir
Faz xixi no chafariz
Menino é assim...
E não cresce nunca.
Menino é eterno.
Estudou tabuada.
Arrumou namorada.
Prestou vestibular.
Endotorou...
Mas o menino vingou.
Na alma.
Na essência.
No deleite da irreverência.
Todo menino é o poeta que dorme...
No tapete da sala do homem de contas.
Todo menino é o que tem vergonha, se assombra na escuridão....
Todo menino é o que ri e o que chora.
O que doa e o que pede esmola.
Sacerdotes da alegria.
Imperadores da cantoria.
E, assim, o homem nunca cresce.
Se agasalha nas asas do menino-anjo que adormece.

Alyne Costa
Brumado, 20 de março de 2007

Friday, March 09, 2007

Por Onde Andei



Pocilga - Alyne Costa, 2002, Acrílica sobre Canson


“Se você me perguntar por onde andei, no tempo em que você sonhava...”
Belchior tem uma música que começa assim.
Naquele tempo ainda se usava perguntar por onde anda alguém.
Chegou-se um tempo em que assombrosamente nos acostumamos com as ausências, talvez até com o terror, o sinistro, a violência.
Parece terrível, mas estamos acostumados.
E não raras vezes achamos engraçado o injusto, o desumano, o frio.
É preferível rir, eu sei, é mais leve.
Mas talvez não seja caso para chorar.
É caso para que esta espécie da qual faço parte não se acostume.
Os mais sensíveis preferem não ler os jornais.
Os menos ficam ávidos por notícias sanguinárias. E crimes, terrores, traições são temas repletos de sentidos.
Quase ninguém fala do amor.
Outros optam por se trancafiar no medo. Ele não resolve, paralisa, gela e é apenas um atalho.
Quase não abrimos as janelas de casa e a de nossas almas.
Desabar é risco de parecer dependente.
Precisamos passar a imagem de onipotência: Eu por todos e eu por mim.
Precisamos não correr o risco de nos mostrar demasiado humanos porque ai zombam de mim, das minhas dores e do meu sentimento de impotência em face de tanta dor.
Por mim? E eu com isso? Problema de quem?
Problema nosso. Em que mundo você quer que seus filhos cresçam? Com que espécie de semelhantes você quer que eles dividam a vida?
Todos nós somos feitos de dores, de traumas, de partidas e chegadas. Somos feitos de sonhos, de quimeras e fantasias e sem eles, nossa alma nubla e nos tornamos moribundos.
Precisamos dos prados verdejantes do salmo 22.
De acreditar em anjos e acender velas ou orar. Não importa em que idioma você fale com seu Deus. Todos nós precisamos de Fé.
De meditarmos acerca de nossas ações diárias e observarmos o quanto não somos capazes de interpretar as coisas da forma mais simples para nós. Deixamos as cortinas de outras experiências serem transpassadas para novas experiências e tiramos conclusões dignas de mestres em Psicologia. Sem sequer intuir que nada sabemos acerca do insondável mistério da mente humana.
E, assim, interpretando mal levamos como verdadeiras as nossas impressões e criamos uma rede enorme de mal entendidos porque me é muito difícil entender como o ser humano não conseguiu ainda exercer com facilidade aquela máxima cristã: não faça aos outros aquilo que não deseja para você.
Eu que não sou estrela, nem cometa, nem rainha, nem sábia.
Eu, aprendiz diária dessa vida, que cresço na medida do possível e que infalivelmente erro.
Eu, que tantas vezes chorei ou fiz chorar.
Eu, que já me arrependi.
Eu, que perdoei.
Eu, que pedi perdão.
Eu, que ainda pergunto por onde anda alguém.
Eu, que sobrevivi a mais de quarenta dias no deserto sem ser Deus....
Queria apenas lembrar a cada um de vocês, caros e raros:
“Se o por do sol parece não ter mais sentido pra você, seja humilde e procure o amor.”
Paulo Coelho.
Um beijo, com o resto da canção de Belchior:


”Amigo, eu me desesperava....”





Alyne Costa


Brumado, 9 de março de 2007

Sunday, March 04, 2007

Meus Ombros Não Suportam Mais Nada

Luiz Gonzaga- 1970 foto retirada do site: http://www2.hu-berlin.de/fpm/popscrip/themen/pst03/pst03040.htm



De vez em quando eu sou um silêncio profundo
Todo silêncio que há no mundo.
Eu calo ante tanta ausência.
A ausência de flor.
Ausência de amor.
Eu calo como que em estado de oração.
E minhas escolhas passam por mim em procissão.
Os abandonos da infância.
Os apelidos da adolescência.
Os maus tratos.
A arte do fingimento.
Fingindo que há sentimento.
E meus ombros não suportam mais nada.
Perdão, Poeta Maior....
Meus ombros não suportam:
A mentira.
A hipocrisia.
A desonestidade.
A histeria.
Meus ombros não suportam mais nada.
E meus olhos cansaram-se de ver.
Amigos, quero-os poucos.
Somente alguns.
Porque esta palavra é rara: Amizade.
E ela é como flor de cactus.
E de vez em quando é preciso aparar as gramas no jardim do coração.
Ouvir Luiz Gonzaga, rei do baião.
E meditar numas canções.
Ô Euclides, o sertanejo é muito mais que forte, o sertanejo é sábio.
Se tu visses no que deu a guerra.
Tu dirias muito mais deste sertão.
Aqui a gente aprende a ser mais ladino.
Ainda se acha água de pote.
Ainda se dança um xote.
E se aprende a lição.
Que o sertão vai na alma de quem parte.
E resplandece na alma de quem fica!
Meus ombros, Poeta Maior, não suportam mais nada.
Mas meu coração sobrevive todas as manhãs.
Trilhando novos caminhos.
Ouvindo grilo e passarinho.
Meu coração se lava na chuva.
Não, meus ombros não suportam peso algum...
Mas minhas mãos são jardineiras enfeitadas.
De uma esperança nova que eu mesma teci.

Brumado, 4 de março de 2007
Alyne Costa

Thursday, March 01, 2007

Se Um Urubu Voar


Poderia esperar por toda a vida
Enquanto os grilos etoam óperas nos vãos dos brejos
E o ursinho Puff de meu filho me olha taciturno
O que foi feito da mãe?
O que foi feito da fêmea?
O que foi feito da gema.
Eu, que não sei ser pela metade
Resto inteira...
Faz frio no sertão.
Recito...
Reverbero...
Deságuo nos riachos que persistem.
Mas, resto-me fêmea inteira
Já sem medos
De garras afiadas
Língua afiada
Cantarolando Dezessete e setecentos
“Você tem que me voltar dezessete e setecentos...”
E se a vida me fez a distância, volto os olhos
Um caldo de maxixe
Um vôo de urubu sobre tanta carniça de corrupção
E já quase meio morta
Tabaco na aorta!
E ainda muito viva:
Alegria e recital.
Que a vida nasce nova quando qualquer poema rasga a alma
O retrato adolescente de meu pai se emudece diante de tanta beleza.
Meu deus, se há deus, ele vê.
E hoje nem é dia de ouvir Chico.
Hoje era dia de ligar candeeiro e caçar feriado na folhinha.
Era pra ta na roça e comer mi assado.
A vida é uma farofa e viver é amassado.
“Cumpadre, tu ta vendo o que eu to vendo?”
É cumpade, mundo veio cheio de falsos profetas e ocultos poetas....
Mundo véio de meu Deus...
De Deusas, Deusinhas e Deusanas...
Das Dores, Da Conceição e Damiananas.
Se o mundo é assim...
Quero ele pra ele e pra mim.

Alyne Costa
Brumado, 28 de fevereiro de 2007


About Urubu:

URUBU-REI
Nome Popular: Urubu-reiNome científico: Sarcoramphus papaFamília: Cathartidae
Ave grande e de colorido vistoso. Envergadura de 180 cm e peso ao redor de 3 kg. Asas largas o que propicia excelente vôo. Asas brancas e negras com o mesmo desenho na parte superior e inferior.
Cabeça e pescoço nus, violáceos-vermelhos, junto às narinas há uma carúncula carnosa amarelo-alaranjada, maior e pendente nos machos. Iris azul claro.
Caminham desajeitadamente; pernas relativamente longas. Não cantam, porém sabem bufar. Para regulação da temperatura corpórea, abrem as asas.
Como consumidores de carne em putrefação desempenham importante papel saneador, eliminando matéria orgânica em decomposição.
São dotados de visão muito aguda, circulando nas alturas já de madrugada e ao crepúsculo. O fato da onça cobrir um animal abatido que não pode ser comido de uma só vez, pode ser uma adaptaçãp para burlar a acuidade visual dos urubus.
Espécie escassa tendo em vista a perseguição como troféu. É mais regularmente encontrado no Norte, Nordeste e Brasil Central.



Sei lá se os urubus que vejo são reis, duques, nobres de vôos, mas chegados a uma carniça. O urubu são mestres na cadeia alimentar.

Viva o URUBU!