Saturday, June 16, 2007

São Joaquim de Todos os Santos


Foto retirada do site:
marcelokatsuki.folha.blog.uol.com.br/arch2006...



São joaquim, feira de todos os santos
De tantas Marias com seus balaios
De tantos Josés com seus temperos verdes, azuis e violetas
De tantos pais e filhos de santos com seus incensos, folhas e fés
São Joaquim, feira de todos os santos
Retrato vivo da história dos escambos
De onde de cara recanto emanam produtos e profusões
Não é feira, é procissão
E seus fiéis, devotos fregueses, buscam em ti, além das belas e frescas frutas, os ramalhetes que oferecem a sua imagem viva.
Seus fiéis, devotos fregueses, buscam em ti a herança recôndita de um tempo em que comprar era o olho no olho da tradição.
Feira de hábitos dos nossos antepassados
Feira livre da invasã dos outdoors
Feira livre das barras de indicação
Feira de São Joaquim da Bahia, eternamente livre de qualquer transplantação.
Laboratório alquímico dos que ali compram, vendem, pexinxam, passam os olhos e apenas vêem.
Feira dos inesquecíveis pregões
Feira dos violeiros
Feira dos repentistas
Feira de todos os artistas
Feira dos nativos de todo canto do mundo que sabe cantar
Feira das madames mais econômicas
Feira dos cachaceiros e suas sonecas sagradas.
Feira universal
Sua beleza provém da permisssão que dá aos homens do exercício da troca
E que seria do homem sem dar e receber?
Feira da livre subistência existencial.
"- Olha a banana da Terra!"





Alyne Costa,Ssa, 4 de outubro de 2002

Monday, June 04, 2007

A Menina e a Tesourinha



Gravura retirada do site: http://www.tkoisas.com.br/ca_49_60_bonecas_papel.htm



A menina e a tesourinha

Havia um tempo em que menina brincava de costureira com bonequinhas de papel. Eram vendidas em cartelas. Recortava-se as bonecas com suas cabeças enormes e suas roupinhas. E elas tornavam-se enfermeiras, colegiais, personagens de contos de fadas.
E assim, estilista mirim de sonho e alegria, a imaginação ganhava mundo.
Era uma época também de reunir os retalhos de minha avó e preparar as roupinhas da Suzi de cabelo cortado por um mão nada destra.
E, assim, naquele zigzag de uma máquina de sonhos, os recortes de tecido ganhavam vida e a tesoura deslizando nos tecidos e papéis, cortavam a inquietação que cresceria com a menina até chegar-lhe a ciência de que tentações lhe traziam a arte.
Bonecas poderiam ser de plástico ou uma soberba Barbie em seu salão de beleza. Todas de igual valor.
E a menina ia tecendo seus sonhos, costurando afetos e aparando dúvidas.
Anos depois outros recortes seduziriam a menina: a audácia de Matisse.
E ela se pôs a recortar medos, angústias e opressões.
Ora com versos e ora com preces.
Ajoelhada ante imagens de santos, índios e caboclos. Pretos-Velhos e Orixás.
Talvez de tantos recortes tenha emanado o sincrético. A crença nos três reis magos e a permanência das orações.
Talvez da mão que manuseava a tesoura nas bonequinhas de papel tenha nascido as mãos que afagam através da arte e da poesia as dores que não lhe pertencem, mas que se tornam suas na percepção de que sonho e dor também se divide.
E assim, docemente, na mulher que amadurece, renasce a menina a fundar reinos com sua tesourinha.





Alyne Costa


Brumado, 4/06/07