Diálogo solitário com Hilda Hilst
Hilda, foi um absurdo ler Do Desejo naquela praia.
Areia, cerveja, suor e sono e a curiosidade por certo.
Aqueles versos xerocados e encadernados que eu lia ávida me transportavam para um Universo do que jamais eu tocaria.
Desejo do diferente e talvez à época um delinquente ou marginal.
Entre tanta novidade daquela literatura que se descortinava eu adormeci e o mar algum tempo me acordou a tempo de salvar a encadernação.
Hilda, falam mal de mim como falaram mal de ti, mulheres que escrevem rompem tabus e trazem medo.
Mas de fato esse lapso de tempo que nos distancia, me traria várias universidades, idiomas, títulos, casamentos, filhos, esperas, buscas e confrontos.
Te fizeste arquiteta de ti mesma no teu lirismo beirando a embriaguez sutil dos primórdios dos meus primeiros versos.
Não fui arquiteta de mim mesma, como tu fostes, fui algoz, juíza e talvez abrigo de mim mesma.
As minhas sabotagens só amputaram as minhas dores.
Os meus indeléveis versos rasgam a minha carne gasta e flácida ao som de um bolero.
O desejo sorve em minha boca, língua e dentes.
Já não tenho paciência, nem pressa.
Devolvido o livro resta a saudade da sua descoberta que me trouxe dúvida e coragem, mas que me fez partir sem mala ou fotografia de paisagem.
Alyne Costa, 23/02/2025
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