Tuesday, January 16, 2007

A Formatura de Manoelzinho

Alex Messias Tenório - Escola Cícera Lucimar
Retirada do site: http://www.ideario.org.br/letraviva/desenhos.htm

Um dia colocaram um brinquedo na mochila de Manoelzinho.
Manoelzinho chegou em casa e ao abrir a mochila ficou todo contente:
-Meus novos colegas de escola me deram um presente!
E brincou horas a fio com aquilo que julgava ser a mais graciosa celebração da sua vida.
A mãe de Manoelzinho num desses pensamentos que só as mães possuem ficou meio intrigada e chamou Manoelzinho no cantinho:
-Filho, pode ter sido algum engano, amanhã você pergunta a seus coleguinhas de quem é o brinquedo, combinado?
Manoelzinho concordou e tratou de fazer a lição. Escola nova, caderno novo, lápis novo e para sua tranqüilidade lá havia um monte de banguelinhas como ele, assim nem teve vergonha de estar sem os dentes da frente.
No outro dia, mal Manoelzinho chegara à escola já sentiu olhares ressabiados dos colegas e muita conversinha no ouvido do outro.
Pouco antes da tia acabar a chamada, Artur gritou, líder:
-Tia, Manoelzinho é ladrão!
Manoelzinho perdeu a cor, o chão, viu um monte de borboleta voando, não conseguia falar nada. Numa escola nova, longe das antigas tias e dos coleguinhas, não sabia o que falar e nem pra onde correr.
A Tia apenas olhou e aquele olhar era uma pergunta.
-Tia, eu não roubei nada, mas ontem em casa achei este boneco na minha mochila, eu já ia perguntar de quem era.
A tia perguntou a quem pertencia o boneco.
Artur, líder, afirmou:
-Tia, é o boneco de Mateus que ele roubou.
Manoelzinho chorava desesperado:
-Não roubei! Não roubei! Não roubei!
Lágrimas copiosas rolavam pela face de Manoelzinho que a princípio estava feliz na nova escola, cheio de sonhos, de encantos com os colegas.
A tia o consolou levando-o para uma salinha onde lhe deu água e acariciou-lhe a face.
Em casa Manoelzinho nada contou à mãe, não queria deixá-la triste. Mamãe andava tão triste, tão preocupada com a faculdade e o trabalho.
Mas ele não conseguia fazer o dever, não entendia porque era tudo diferente da outra escola. Pedia ajuda a mamãe, mas ela não entendia como o filho podia estar sentindo dificuldades em coisas tão bobas, até mais fáceis que na escola anterior. Tentava, tentava, até cansar.
E assim os meses foram se passando, Manoelzinho só tinha uma amiguinha na sala: Maria Angélica que brincava com ele no parquinho. Tinha também um amiguinho da outra série, um ano mais novo que confiava nele, lhe emprestava brinquedos e até trocavam figurinhas.
Mas na sala Manoelzinho ficava mudo, não entendia as tarefas, voava por planetas enquanto a Tia dava as explicações.
Um dia teve reunião no colégio: o dia da entrega do boletim.
Mamãe sabia que algo não estava indo bem, mas foi até a escola para ouvir e depois de ouvir os elogios e os talentos das outras crianças recebeu, por último o boletim do seu filho.
Após contar um pouco os problemas financeiros que atravessava, escutou da Tia uma recomendação de levar Manoelzinho a um especialista, pois o mesmo demonstrava problemas de audição.
Mamãe estremeceu, como pode por tanto tempo não notar alguma deficiência no filho?
Em casa cobria-lhe de carinho e com muito medo, marcou o exame.
Acontece que no dia do exame, Manoelzinho que não era ladrão, também não era surdo, aliás, ouvia muito bem, só que se calava quando ouvia injustiças.
Mesmo assim Manoelzinho continuou na escola, fingindo que não ouvia, orgulhoso da sua inocência e embora a tristeza pesasse em sua face quando ia para escola, nascia quando voltava para casa pelas ruas que atravessa quando Nilson, o ajudante de sua avó ia lhe pegar.
Pelas ruas Nilson contava histórias de bicicletas que voavam, pássaros que tornavam-se automóveis e espingardas que explodiam balões coloridos.
E pelas mãos de Nilson, Manoelzinho atravessa as ruas da dor da desconfiança e do preconceito.
Até que chegou o fim do ano e a turminha estava se organizando para a festa de formatura.
Manoelzinho, embora todos soubessem que não iria formar, era levado aos ensaios. Era ensaio para a missa que seria numa Igreja muito famosa com um padre também muito famoso. Manoelzinho ia também, participando na sua inocência e celebrando a vitória dos outros porque em algum cantinho de seu coração ele sabia que uma dia celebraria a sua vitória.
Mas apareceu um professor de música que ensinava aos meninos os hinos e a voz de Manoelzinho destacou a tal ponto que, impressionado, o professor de canto queria lhe dar destaque.
A Tia resolveu chamar a mãe de Manoelzinho, ele precisava participar da formatura ainda que simbolicamente, seu canto soara diferente.
Mas mamãe não consentiu. A festinha era cara demais pra suas condições.
Bom, Manoelzinho mudou de escola no ano seguinte. Aprendeu, sorriu, freqüentava as festas e dançava alegremente, livre de qualquer rótulo ou preconceito.
Nesta nova escola em que as crianças aprendiam brincando, Manoelzinho aprendeu a ler e a não se calar perante injustiças. Aprendeu a ser aceito e se aceitar diferente. Cantava alegremente, corria e aprendia.
No fim do ano formou-se em menino alegria, livre da dor.

Para Victor meu filho, graduado em boa vontade,
Brumado, 16 de janeiro de 2007

1 comment:

Anonymous said...

Manoelzinho, êta moleque...
Felicidades.
Iara.