Wednesday, August 30, 2023

 

Laço

 

Num passo, te enlaço

E, se me perco, te acho

E, se te acho, me perco

Num catálogo de endereços

Numa loja de adereços

Não há mais relicário, nem telegramas

A escrivaninha está sozinha

Na vitrola qualquer musiquinha

Ghost

E se tropeço, não caio

Tudo que não cumpro, um percalço

Tudo diferente e um mundo ausente

Enquanto coloco no meu coração de aço

Uma tela em branco e um laço.

 

Alyne Costa, 30/08/2023

 

Thursday, August 24, 2023

 

O Poema Amanheceu

 

Hoje eu fiz um poema de encantamento

Encantamento com a vida que aflora

O carteiro lá fora

As cores da aurora

 

Hoje eu fiz um poema pra lua

Para a saudade nua

O barco que flutua

A moça da rua

 

Hoje eu fiz um poema pro tempo

Pro balão no vento

Pra flor do momento

Pro meu sentimento.

 

Alyne Costa 24/08/2023

Thursday, August 17, 2023

 

Ser mãe não é qualquer coisa

Ser mãe é uma premiação divina que nada subestima, é o maior de todos os dons. O dom do prosseguimento da vida. Talvez por isso Drummond disse que “Mãe devia ser eterna”. No coração dos filhos toda mãe o é.

Sentimento de mãe é algo que move, remove qualquer obstáculo. Mãe sente, mãe pressente, amor de mãe é comovente.

Das decisões de minha vida tem uma especial demais, ser mãe. Acordar de madrugada só para conferir se o bebe está respirando, preparar a papinha, levar à escolinha, ensinar a tarefa, rir das rebeldias de adolescente.

Ser mãe não tem palavras, a gente simplesmente sente...

Alyne Costa, 17/08/2023

Saturday, August 12, 2023

 

Naquele tempo parecia ter o céu um azul mais céu. E as nuvens costumavam brincar como carneirinhos correndo soltos ao vento. Só faltava mesmo o verde de uma colina qualquer.

E ele costumava me acordar antes do nascer do sol para ver os primeiros raios aparecerem do alto do morro.

E me levava em seus braços. Eu, ainda sonolenta, sentia aquela alegria única de ver o mundo amanhecer naqueles braços, meu porto. Tirava-me da cama, sem coberta e eu era despertada pela brisa fria da manhã da vida.

E caminhava comigo ouvido o cocorejar dos galos, a doce melodia do dia que chegava. E não lembro mais de nenhuma viv´alma que presenciava aqueles momentos. Tão meu e dele. Só nós protagonistas. E eu sorria o riso mais aberto do meu coração em flor. Eu sorria a plenitude daquele amor.

Atravessávamos o quintal e o pé de manacá ao lado do portãozinho do fundo parecia dar até logo. E saíamos para desbravar o mundo novo do dia que nascia. Eu vestida de inocência, ele despido de ambição. E chegávamos no morro. Ele me erguia para perto do céu. O sol me abraçava. E a vida me intimava a crescer.

E meu pai, quando me acordava antes do dia nascer. Me mostrava que a vida seria assim... Sempre. Um convite. Uma dádiva. Inevitável fenómeno.

E seus braços me guiavam à  sensibilidade. Talvez um batismo no mundo dos sentidos raros. Mas meu pai, ao som do cocorejar dos galos e do canto dos primeiros pássaros, me acordou pro amor. E o nosso amor foi sempre um amor puro, extrato, fina essência, azul de matizes de um céu que amanhece. E até hoje, quando preciso acordar na vida antes da vida amanhecer, sinto-me em seus braços, porto das minhas aflições. Desperto-me com a brisa fria dos recomeços. Costumo sorrir plena, repleta de um amanhecer e mais perto do céu.

 

Para meu pai, João Roberto, 2004

Sunday, August 06, 2023

 

Às vezes o dia tem gosto de saudade de um tempo, um pequeno momento...

E a gente fica fina flor de sentimento.

Sentimentos muitas vezes transformam-se em ausências, algumas doloridas e outras refrescantes.

Um texto desses que circulam nas redes trata de “quando a casa dos avós se fecham”.

Quando perdemos nossos avós perdemos uma boa parte de nossa esperança.

Saudade tem recheio de goiabada cascão e a gente teima em sonhar na contramão.

A gente tem certeza do dedo de Deus em muitas coisas e em momentos, por sermos humanos e imperfeitos, não conseguimos ser leves e falhamos. Outras falham com a gente e, ou vem o perdão ou o esquecimento.

Porque lembrança tem que ser boa. A alma sorri com as lembranças boas, aquele abraço sincero, aquele sorriso cúmplice, a indignação no olhar que u amigo entende e acolhe outro amigo.

Lembrança é quase compaixão, quando nos encontramos com um pedaço de nós mesmos que não se perdeu no emaranhado do tempo.

E uma musiquinha toca leve como um violino.

E a gente pensa que no silencio talvez more a voz de Deus ou a nossa voz pedindo um pouco de paz.

Paz de criança que cansa na dança do vento e por um momento brincou de ser aprendiz.

 

Alyne Costa, 06/08/23