Wednesday, November 23, 2011

Lições do Desconnforto




Uma vez ou outra na vida nos deparamos com o desconforto. Seja ele proveniente de uma dúvida, uma quimera, uma dor física que desconhecemos a origem, uma dor na alma proveniente da sensação de não termos tomado o rumo certo.
Nos sentimos meio perdidos na vida, no desconforto da insegurança. Não vemos borboletas, apenas traças que rapidamente destroem as névoas de lembranças boas, de dias felizes e de esperança.
E, assim, como quem quebra um osso precisa de ortopedia para superar a dor, necessitamos com urgência ir em busca do nosso nicho, o nosso grande tesouro interior.
Um banho quente, uma roupa macia, uma música bela, um por do sol...
Uma viagem real ou de sonhos.
Lembranças de amigos, reais ou imaginários.
Rever aquele filme que tanto gostamos.
Entrar em contato com nosso próprio templo e fazermos uma prece.
Esquecermos um pouco o rigor e assumir uma postura mais flexível e nos perdoarmos intimamente por maior que tenha sido a burrada porque vida é processo contínuo de aprendizados e recomeços e como é confortável ter fé.
“Fé na vida, fé no homem, fé no que vier” e assim com o pulmão repleto de ar, deixarmos a alma chorar e como um rio lavar a nossa própria falta de compreensão de razão de vida.
Lembrarmos de uma história contada na infância e buscar pela sobrevivência de nossa identidade os nossos sonhos que se foram, despedaçados pelo caminho.
Confortável é o peito que vibra de amor e perdão por beijo de filho, colo de mãe e saudade de pai.

Alyne Costa, 23/11/2011

Saturday, November 05, 2011

Resgate



Você me amordaça e me tira a graça...
Depõe contra mim.
Me estilhaça.
Me joga no chão e tripudeia.
Como se não tivesse nem sangue na veia.
Me cobra dobrado o bem que pensa que me fez.
E eu que não sou dama de um baralho.
Te deixo jogar sozinho.
Me escolhe as vestes, os meios e os fins.
E meu grito oprimido é meu silêncio vendido em módicas prestações.
Um silêncio que ninguém entende nem quer entender.
Um silêncio de mulher que sabe que na hora certa vai vencer.
E enquanto você fala para uma palestra invisível eu finjo que não vejo.
Eu finjo que beijo.
Eu finjo que não sei.
E nesse patins sem rodas eu desfilo pela vida.
Deixo que me joguem pedras.
Deixo que me condenem sem contraditório.
Calada, deixo morrer a poesia.
Calada, tremo em face ao abismo.
Calada, eu já nem cismo.
Mas ainda há amor.
Um amor que vinga e adormece embora acompanhe sua pasta de notas fiscais...
Seus telefonemas em código.
Suas fugas para além do cais.
Já não tenho medo porque guardo um segredo.
Falo em dialeto cigano, da vida que, por engano, insiste em sobreviver.
Resgato sorrisos...
Fico só observando as mudas gravuras na parede.
A mulher sem terra se envergonha de mim.
É que eu não sei ser assim tão única.
Eu sou várias.
E às vezes me dispo pra um varão invisível que pagará meu resgate.
E me levará de volta ao templo de sonhos.
Povoado de anjos de vários tamanhos.
Onde meu sorriso se descortinará!

Alyne Costa
5/11/2011

Sunday, October 30, 2011

Mosaico


Pieta


Penso em traduzir sentimentos.
Dores, silêncios, lamentos...
A vida? Desenho a giz.
Trago uma caderneta de aprendiz.
E assim me refaço.
Trago novas rugas num sótão de ausência.
Não quero regras.
Um catavento como referência.
Menos cismas e mais paciência.
Um bem-te-vi me acorda todas as manhãs.
Sem que eu perceba, meu coração se abre em festa.
Aparo as arestas.
Colo-me em mosaico de tons pastéis.
Intensa, me agarro nos momentos.
Guardo frases de recordação.
Um mapa mundi na palma da mão.
Por vezes navego na contramão do previsível.
E cochilo à sombra do irremediável.
Do sem costume.
Do sem jeito.
Do bem que sinto e guardo no meu peito.
Que se extravasa na amplidão do mar.

Alyne Costa

Friday, October 28, 2011

O Amor Sem Bordas



E eu aprendi a amar um amor sem bordas. E tenho a sensação estranha de que eu não deva desistir. Absurdo ver o amor derramando numa imensa vontade de ser una. Una com essa manhã cinza de um frio fora de tempo. Una com essa vontade de ter a pele dele. ( O absurdo é tão somente o que não aceita um desafio? É apenas aceitar a regra imposta? Como se o dito fosse um rito... O absurdo é não poder mais amar; ) Una com uma vivência mais natural. Una com toda a natureza, com a paz e com a autenticidade de reagir. ( Mas ele é apenas um menino de 21 anos que eu aprendi a amar loucamente, amar cada suspiro dele e cada minuto dessa ausência insana. ).
Não há coerência na paixão. Eis sua razão de ser. Mas no amor tudo é coerência, tudo é de uma harmonia sublime. O amor sem bordas sabe não ter rumo certo, sua coerência está na imprecisão, mas ainda assim ele é fértil, manso, quase caipira. E de tão frágil e ao mesmo tempo intenso, vai construindo teias. Relendo antigos versos. Ouvindo as canções mais tolas. Tecendo o fio da vida como um processador de novas formas de viver. O amor sem bordas não teme. Não tem muita razão, pois não é mesmo pra ter. É essencialmente uma explosão de ser. E de repente o dia amanheceu.
Caminha pelos cantos, sobe pelas paredes, chora de saudade e emudece. Dias e dias vazios. É amor de quem amadureceu e não perdeu a inocência. De quem morre se perdê-la. Porque pressuposto básico do amor sem bordas é não esperar nada em troca, mas esperar... Esperar... O amor sem bordas não tem pressa alguma. Quer estar junto sem invadir, dividir. Ouve as canções da infância. Invade a casa do vizinho, toma um café. Está na sala de aula. Morre de rir. Estoura a espinha da terra. Quebra o espelho. Amaldiçoa e se arrepende. O amor sem bordas é eternamente adolescente e quase ancião de tão sábio. ( E, de repente: Ele não tem nada a ver comigo. Somos de mundos diferentes. Ai, que coisa mais paradoxal. As vezes ele está tão estranho. Hoje mesmo ele entrou e nem falou comigo. Zorra, nem gravou o número novo do meu telefone. Também... Quando ele nasceu eu já sabia ler... Ah, ele ainda é um menino de 21 anos. )
Mas o amor sem bordas é dissimulado... Fala que ama, mas não diz. Faz parte de sua magia querer ser lido nas entrelinhas. E inaugura então o idioma do sorriso. O amor sem bordas diz “eu te amo” quando ri. Então para entender o amor sem bordas alguém terá que saber ler sorrisos? Não, você pode também não entender. Ele não faz a mínima questão de ser entendido. Ele é poliglota! Fala em tatibitate também. Não que ele não tenha seu orgulho, tem sim, ora, sendo sua razão amar, o amor sem bordas quer ser reconhecido sim, ter seus minutos de fama no brilho do olhar de quem o captou.
É como um golfinho. Belo e escorregadio. Muito engraçado e adora criança. Mas esconde uma certa tristeza sim... Lá num cantinho da alma de quem ama o amor sem bordas há uma tristeza distraída ( e que fique assim por muito tempo! ) E, de repente, a gente se percebe mais paciente e calmo. Mais assíduo. Mais responsável. Bem mais cidadão. A gente se percebe mais inteiro. Feliz como golfinho e não como gente.
O amor sem bordas embora ressoe em todo coração que encontre, é egoísta, ama primeiro a si mesmo. O amor sem bordas sabe que é a única forma de amar, mesmo assim, deixa os meninos brincarem dizendo que amam; é tão bonito ouvir falar de amor... Mas eu ainda não me declarei ( ou já? ). Isto não faz nenhuma diferença. Não vou deixar de amar.
O amor sem bordas morre de medo de dar certo. Ele sabe que é correspondido, só não quer admitir. Tão simplesinho. E vai assim... Passando dias e dias. O amor sem bordas não quer nunca acabar. ( Eu adoro o jeito dele falar, amo cada monossílabo, cada respiração...) Quem pode imaginar o quantum do amor sem bordas? Quase uma heresia...
O amor sem bordas acredita no poder da palavra. É como um senhor alto, magro, de chapéu e um bocado de idealismo, sempre com uma frase gentil... O amor sem bordas é a cara de Gentileza! É também um adolescente de boné que rabisca versos no caderno que jamais teve coragem de mostrar para a menina de óculos ocultando os olhos, agasalho escondendo o corpo e tantos outros versos que jamais teve coragem de mostrar para o adolescente de boné.
O amor sem bordas ama sem olhar para os lados, pois não se importa de ser visto, embora a miopia reinante lhe permita certa clandestinidade. O amor sem bordas fala palavras obscenas. Ele desconhece tabus.
Não que seja vanguardista. De fato, é um conservador. Estabelece uma nova ordem para sempre insubstituível: Amar sem bordas. Daí emana seu aspecto revolucionário... Nada será como foi. ( Mas eu preciso levantar agora.... Lá fora cai uma chuva forte e tão escuro está o céu, que eu quero ver a chuva, costurar no tempo, imaginando como seria ele aos dez anos de idade chateado por uma chuva como esta lhe impedir de ir jogar futebol. E dormir um bom pedaço do dia também.

Alyne Costa

Friday, October 07, 2011

Eu sei...



Tava querendo brincar de brincadinho.....
Eu, assim, de amor assustadinho...
De saci pererê,
Eu atrás de você!
De mula-sem-cabeça:
Você quando der, apareça!
Mas vc resolveu morar em meus lençóis.
Formar em minha mente uns nós!
E eu que sou gente que sente,
Gente, sabe, assim, meio diferente...
Resolvi fugir dos seus laços.
Guardando horas pros teus abraços.
Eu: Guardo um mundo pra ti!
Eu que sou o seu bem-te-vi!
Que sempre sobrevivi!
Que nunca de amor morri...
E você me leva pra Pós...
Eu meto isca nos anzóis...
Eu arremato o algoz.
Sou fera e caçador.
Sou fêmea pra toda dor.
Eu sei parir sem chorar.
Eu sei sorrir sem flutuar.
Eu sei amar sem chorar.
Sim...
Eu sei!

Alyne Costa, 8/10/11

Sunday, September 04, 2011

A Filosofia



Como num laço, me desfaço...
Não fui feita em linha reta.
Não quero seta.
Quero um raio de sol e a porta aberta.
Abro mão das meias verdades.
Já saltei os muros da dor.
Corre em minhas veias a solidão que entorpece.
Lenitivo e veneno.
Caminho seguro da alma que envelhece.
E sabe os riscos de saber demais...
E a angústia de nada saber.
E o que falta é a filosofia...
Que me visita a cada dia.
No seu olhar de alegria.

Alyne Costa
4/09/11

Sunday, August 28, 2011

Aprendendo Amar



Todos os domingos pela manhã ele vai à missa e me convida. Eu não consigo me levantar porque gosto muito de dormir até mais tarde...
Aí quando ele volta sempre traz flores e coloca do lado da cama. E essas flores, sempre as mesmas, já compõem a paisagem do meu domingo.
Ele faz milagres. Me cura, me salva, me afaga e me beija.
Eu sou distraída e tenho o desespero dos poetas.
O que machuca a ele dói demais em mim e eu desabo. Porque nessa comunhão de vida, eu pude então conhecer a força de um afeto.
Na minha desordem ele acha fotografias, um velho ponche que ganhei de meus tios na infância e me traz de volta o caminho.
Mora em mim uma tristeza latente que ele não compreende porque ele é pra fora e eu pra dentro...
Ela é discurso e eu silêncio.
Ele é meta e eu improviso.
Ele é mesa ornada aos domingos, eu bóia-fria...
Mas ele é aconchego e eu também...
Somos ternura, delicadeza.
Ele foi minha mega sena.
Ele me deu disciplina.
Ele está na minha fundação e eu lhe faço massagens com óleos perfumados para que ele me perdoe dos meus pecados.
E por enquanto eu aprendo amar...
Como quem começa a fazer poemas.

Para Tonga, 28/08/11
Alyne Costa

Saturday, August 13, 2011

Dona Culpa


Hoje amanheci com culpa.
Culpa porque ele pediu e eu tirei a roupa, aquela roupinha linda de dona de casa que você me deu...
Talvez tenha sido isso, a roupinha era confortável demais e eu gosto de asperezas.
Eu sei que você vai querer me colocar no colo e tirar de mim essa sensação ruim e certamente vai jogar toda culpa nele, mas não. A culpa é minha!
Não, ele não me tocou, não dessa vez...
E eu não permitiria que coisa alguma acontecesse, eu só queria mesmo tirar aquela roupinha de dona de casa em fino estilo.
Por isso acordei tão cedo...
Por isso não fiz o café...
Por isso eu disse te amo como quem pede desculpas.
Certa ocasião uma amiga comunista me disse que culpa era um sentimento burguês. Eu aboli culpa de minha vida.
Mas hoje ela veio toda saliente, sussurrando em meu ouvido:
-Traíra!
E eu confesso que temo não ter coragem de olhar aquela roupinha de novo, com suas florzinhas amáveis, seus delicados babadinhos. Roupinha de dona de casa assistir novela! E eu tirei para ele, poxa vida, quase um streap tease...
Não, não foi bem assim... Foi rapidinho! Quase uma espiadela.
E agora estou eu aqui, me entregando... Ouvindo Joana...
Se lembrar do passado, eu tenho um lenitivo, mas eu não posso sequer ter memória, a culpa não deixa.
Roupinha de dona de casa, era só o que me faltava...
Olhe Dona Culpa, acho bom a senhora procurar outra. Eu li Hilda Hilst! E cá pra nós a senhora não é minha, a senhora é dele! Tivesse ele me dado um saco de batatas fritas, o desfecho seria outro.

Alyne Costa
13/08/11

Sunday, July 17, 2011

A visita



Ele não visitou minha rua esta manhã como há semanas costumava fazer, com seus passos largos que prolongavam a calçada.
Não ajudou as velhinhas a atravessarem as ruas com suas sobrinhas coloridas, cujos desenhos me roubavam a sensação de dia de chuva e me transportavam para dentro de suas casas como se me convidassem a tomar um chá e com ela iniciasse diálogos sobre tempos de normalistas, filhos doutores e novas faxineiras.
Não parou em frente ao jornaleiro para ler as manchetes e nem comprou um maço de cigarros. Por lá não passou...
Não brincou com as crianças que entravam e saíam nos braços e nas mãos de pais e mães nervosas da clínica de emergência infantil.
Não pegou a condução e não foi ao cinema. O vendedor de canetas coloridas continuava adentrando todos os ônibus oferecendo seus produtos, motoristas e cobradores também eram os mesmos, mas ele não estivera em nenhum assento.
Na missa das 17 horas na capela do hospital o capelão pregava para os mesmos fiéis seu sermão cheio de filosofia e senso de humor, mas nem a fé, nem a beleza das imagens angélicas que ornavam o altar até lá o conduziram.
Da janela cinza meus olhos pareciam atravessar a cidade em busca. Uma busca sem endereço e sem direção. Acompanhava os táxis que paravam numa esperança cega que por ali descesse.
Passei a contar os carros em cores, mas eram muito rápidos. Mudei para os transeuntes, mas àquela hora já eram raros. Resolvi deixar acesas todas as luzes da casa. Um sinal. Quando o barulho de automóveis foi desaparecendo, passei a alternar a visita a janela à varandinha e a esperança não morria parecia agarrada às folhas da jibóia.
Já estava quase adormecendo quando ouvi o barulho da campainha. Abri a porta e ele me segurou uma das mãos se dirigindo ao sofá onde deixou o seu corpo cansado cair.
Seus olhos aprofundaram-se nos meus e ele pediu:
- Deixe sempre as luzes e a esperança acesas para que o amor não se perca no caminho.
Apaixonada, adormeci.

Alyne Costa
17/07/11

Friday, July 08, 2011

Carimbos



Queria colecionar carimbos.
Não se irrite.
Não de palpite.
Não dê as caras.
É brincadeira.
Pura besteira.
Já basta.
Não ligue.
Por carta.
Por e-mail.
Inútil.
Perfeito.
Superficial.
Estreito.
Raso.
Profundo.
Oceano.
Mundo.

Alyne Costa 8/07/11

Thursday, June 30, 2011

Amar Tanto e Até Morrer



Onde mora a minha dor?
Habita o meu silêncio e permeia meus sonhos.
Desenha a minha distância nos morros de um caderninho encantado.
A minha letra borda em suas páginas correspondências.
Cartas de amor.
Cartas de despedida.
Cartas de boas vindas.
Algumas lições de esperança capturadas no olhar da menina de tranças.
Onde mora o meu perdão?
Nas flores de maio que nascem na palma de minha mão.
No meu velório e na minha primeira comunhão.
Numa saudade que transborda as veias do coração.
Veias e esquinas.
Veias e alamedas.
Veias e praças repletas de flamboyants.
Onde moram meus vícios?
Na sede de desespero e riscos.
Nas chagas da incompreensão.
No abandono e na solidão.
Na solidariedade e no dividir o pão.
Onde mora o meu amor?
No meu olhar que mareja.
Na alma que inteira viceja.
No corpo que ele beija.
E até numa certa agonia...
Que persegue noite dia...
Este peito de poeta.
Que já não reconhece as setas de ser só e uma só ser.
E, por tristeza ou quebranto, capaz de causar espanto.
Ama tanto e até morrer.

Alyne Costa
30/06/11

Wednesday, June 22, 2011

Na Hora da Tristeza




Tem dias em que a gente amanhece nublada pela nódoa de uma incompreensão qualquer...
Nenhum beija-flor aparece na janela, suas certezas todas se rompem e você se recolhe num cantinho da sua insignificância perante o universo e simplesmente assiste.
Simplesmente é hora de deixar as preocupações irem embora, talvez acordar com os olhos meio fechados, mas ainda assim procurar seu nicho.
Algumas coisas maculam a amizade: incompreensão, preconceito, desrespeito, grosseria, ingratidão, mal entendido, fofoca, intriga, inveja, machismo e um rol imenso que podem trazer sensações de amargura, que trazem aquele gosto de ferrugem na boca e a certeza que seu incômodo é o carimbo da sua diferença.
A fé não morre, nenhuma crença, mas você se vê sem suportes e se depara ante a fragilidade dos laços dessa vida.
Na amizade não cabe disputa porque amizade não é luta.
É muito arriscado brilhar!
Mais arriscado ainda é se calar...
Certo é que divergências sempre existirão, questionamentos, crises e tudo te enriquecem enquanto ser humano, te tornam mais apto, preparado para aprender a ser sempre aquilo que se é.
E assim é a vida. Há dias de puro sol, brincadeira e riso. E se vier ventania, enfrentá-la de peito aberto. Com o vento fresco da liberdade acariciando a face com ternuras.
Mas há dias cheios de cadeados. E você pode observar com calma a diferença alheia, os limites dos que te machucaram, a profundidade das rochas.
Dias de sacrifício, de sumir, se omitir, assumir sua incapacidade perante algumas circunstâncias. Chorar por horas... Ler nas entrelinhas da vida que nem sempre valeu a pena. Que o amor é grande, mas a vida é pequena. Curta demais para tanto amar...
As dores tal como as alegrias foram feitas para serem vividas. Têm seu tempo e seu lugar. Não adianta atravessar a rua e fingir que não viu.
É necessária essa clausura da tristeza pra espantar a torpeza e acordar num outro dia tendo na alma um novo sabor.

Alyne Costa
22/06/11

Monday, June 20, 2011

Brilho das Estrelas



Mora no tremor das minhas mãos um sonho...
Um sonho que assina com o sobrenome de: Esperança.
Do meu sonho não aniquilar nenhum outro sonho humano.
Do meu sonho ter par e ter alguém pra dar passos juntos.
Pelo sereno das madrugadas...
Por deleites entre almofadas...
Por passeatas coloridas.
Onde todos brilhem na sagrada utopia.
Pela qual muitos morreram um dia.
Para que estes muitos sonhos ganhassem as ruas, ganhassem voz.
Marchassem por todas as formas e expressão da Liberdade: Matriz primeira.
Sou poeta e somente compreendo o que o meu amor comporta.
A minha luta de poeta também é revolucionária e não é vã.
Por vezes é uma luta que emudece...
Notras se cala quando pertinente...
Tenho ainda por hábito risos sinceros e lágrimas verdadeiras.
E, assim, consigo ver o brilho de todas as estrelas!

Alyne Costa, 20/06/11
“EU QUERO PODER PRA PODER AMAR!”Tonho Matéria

Wednesday, June 08, 2011

Poema de Mulher



Ai, meu poema sem beirais nem cais
Que mais nem suporta meus ais...
Que é febre quando o corpo ainda não dói.
Que é boca seca de palavras belas.
Meu poema que trancou as janelas.
Para nascer do frio e da escuridão.
Do meu peito torto e de aleijão.
Do sangue que passeia nas veias.
Do copo que escorre das mãos.
Ai, meu poema triste...
Feito da maior dor que existe.
Da histeria e da consagração.
Vai meu poema manco.
Abre o jornal e lê sobre o assalto a banco.
Navega os mares que não existem mais.
Beija princesas.
Honra rainhas.
Mulheres tuas.
Mulheres minhas.
Ai meu poema chulo.
Fala travessuras no escuro.
Diz que ama.
Diz que goza.
Diz que quer.
Ai, meu poema de mulher!

Alyne Costa
6/06/11

Sunday, May 29, 2011

Abraçando o Desespero



Parecia que andava de patinete por alamedas de um sonho doce. Uma fragância suave de jasmim me invadia e eu tinha vontade de viver de novo aquele viver inocente da infância não essa vida às avessas cheia de pressas e falsas respostas.
Eu lia os versos de Manoel de Barros e observava uma tela de Gustav Klimt e tinha uma súbita certeza que algumas pessoas são oníricas e necessárias a existência das outras porque o ser humano sem sonho está fadado a morrer de fome da vida.
Eu já havia tentado toda espécie de cura para meu desespero. Confesso que já havia feito consulta a uma médium que me fizera tomar um banho de schincola que me rendeu uma boa gripe, mas a cura não vinha...
A minha indignação morava solitária em meu peito junto com um grito preso na garganta, feito feto morto que não saía e minha barriga crescia como se vida havia ali dentro, mas não era vida, era dor.
Eu seguia grávida daquela arbitrariedade que tirara o chão e me fazia ter sentimentos ocos que não me agradavam porque de fato não me pertenciam, pertenciam ao grito que não saía. Um grito humilde, subjugado, covarde, carente de eco e sem esperança.
Até que uma hora imprevisível e desapropriada ele saiu e eu vi o anjo negro voar para longe de mim.
Eu pude ver a cor da Liberdade! E abracei meu desespero, meu destempero e meu desequilíbrio porque preciso deles para me sentir viva.
Alyne Costa
29/05/11

Saturday, May 21, 2011

Gaiola


Imagem retirada do Blog http://jornale.com.br/petblog/?p=601

Ainda não sei a cor do caminho, mas vou...
Sem pressa, sem medo, sem pacote
E se ele estiver em flor, eu abro um sol
E se estiver nublado, aparo a queda
Eu vou ali comprar um batom
Tirar uma medida
Tomar uma média
E se ele for setembro, eu fevereiro
E se ele chorar, rabisco a lua
E se ele não for?
Eu nem metade
E se ele não aparecer?
Eu, sim, saudade...
E se ele for Caetano, eu canto o Tom
E se for amanhã?
Eu Djavan...
E se não for bem assim?
E se não for urgente?
E se não for prece?
Eu oração....
Eu busco um guia, carrinho de mão...
E se era pra ontem?
Eu já nem sei.
E se acabou?
Precipitei.
E se ele for saturno?
Eu sou de lua...
E se ele nem souber?
Porra, que intua!
E se desistiu?
Não leu os sinais?
Eu corro atrás.
E se for de mármore?
Eu, astronave.
E se voou?
Um novo amor.

Alyne Costa

Do livro 29 Fragmentos

Wednesday, May 18, 2011

BLOG PROG BA



A dinâmica da comunicação na internet atravessa um momento inimaginável. Os movimentos sociais alcançaram escopo dentro da rede e podemos mensurar que ao lado da mídia tradicional temos outras alternativas à sociedade, de fácil acesso e baixíssimo custo.
No último pleito eleitoral presenciamos a força dos blogs e das redes sociais no processo, com os políticos buscando compreender e agir neste contexto.
Não é exagero algum afirmar que muitos blogs destruíram factóides políticos criados com escopo de prejudicar a candidata Dilma Houssef e a proliferação dos mesmos facilitou o esclarecimento do eleitor, engajando-o melhor na disputa eleitoral.
Recentemente estão ocorrendo no Brasil os Encontros Estaduais de Blogueiros Progressistas, tais como em São Paulo e Rio de Janeiro, dentre outros, todos preparatórios para o Encontro Nacional que será sediado ainda este ano em Brasília. Tais encontros, propiciando a vivência e discussão entre os participantes da blogosfera em efervescência, além de promover enriquecidos debates e trazer importantes nomes do cenário, fortalece a categoria ao acenar para uma maior organização do grupo e tirar importantes conclusões de seus debates.
Nesse contexto a Bahia de Glauber Rocha não poderia estar de fora. Assim, nos dias 10 e 11 de Junho, os Blogueiros Progressistas da Bahia estarão reunidos discutindo temas de ampla importância como a democratização da mídia e a banda larga e trocando idéias, sonhos, singularidades sobre tudo que permeia a realidade da blogosfera na Bahia. Desse amplo debate que versa sobre tema ainda novo, nenhum blogueiro progressista deve abrir mão. É a oportunidade de lançarmos nosso canto para que seja ouvido e de unirmos nossa força para que tenha amplidão!

Alyne Costa
18/05/11

Sunday, May 15, 2011

A Vida



Meu gato senta em meu colo e sussurra:
-A vida é curta...
O barulho da motocicleta sugere:
-A vida é ritmo...
O japonês do balcão segreda:
-A vida é lânguida.
No velho rádio Gonzaguinha ainda canta:
“O que é o que é, meu irmão?”
A amiga obstinada chora:
-A vida é o choro do filho que eu não pari!
O irmão diz:
-Relaxe...
O poema de Drummond decreta:
“-A vida é breve e o amor mais breve ainda.”
Mas meu coração...
Ai, esse tolo, sem assunto, sem atenção, grita aos meus ouvidos:
A vida é ele!

Alyne Costa

Friday, May 13, 2011

O Amor Sem Bordas



E eu aprendi a amar um amor sem bordas. E tenho a sensação estranha de que eu não deva desistir. Absurdo ver o amor derramando numa imensa vontade de ser una. Una com essa manhã cinza de um frio fora de tempo. Una com essa vontade de ter a pele dele. ( O absurdo é tão somente o que não aceita um desafio? É apenas aceitar a regra imposta? Como se o dito fosse um rito... O absurdo é não poder mais amar; ) Una com uma vivência mais natural. Una com toda a natureza, com a paz e com a autenticidade de reagir. ( Mas ele é apenas um menino de 21 anos que eu aprendi a amar loucamente, amar cada suspiro dele e cada minuto dessa ausência insana. ).
Não há coerência na paixão. Eis sua razão de ser. Mas no amor tudo é coerência, tudo é de uma harmonia sublime. O amor sem bordas sabe não ter rumo certo, sua coerência está na imprecisão, mas ainda assim ele é fértil, manso, quase caipira. E de tão frágil e ao mesmo tempo intenso, vai construindo teias. Relendo antigos versos. Ouvindo as canções mais tolas. Tecendo o fio da vida como um processador de novas formas de viver. O amor sem bordas não teme. Não tem muita razão, pois não é mesmo pra ter. É essencialmente uma explosão de ser. E de repente o dia amanheceu.
Caminha pelos cantos, sobe pelas paredes, chora de saudade e emudece. Dias e dias vazios. É amor de quem amadureceu e não perdeu a inocência. De quem morre se perdê-la. Porque pressuposto básico do amor sem bordas é não esperar nada em troca, mas esperar... Esperar... O amor sem bordas não tem pressa alguma. Quer estar junto sem invadir, dividir. Ouve as canções da infância. Invade a casa do vizinho, toma um café. Está na sala de aula. Morre de rir. Estoura a espinha da terra. Quebra o espelho. Amaldiçoa e se arrepende. O amor sem bordas é eternamente adolescente e quase ancião de tão sábio. ( E, de repente: Ele não tem nada a ver comigo. Somos de mundos diferentes. Ai, que coisa mais paradoxal. As vezes ele está tão estranho. Hoje mesmo ele entrou e nem falou comigo. Zorra, nem gravou o número novo do meu telefone. Também... Quando ele nasceu eu já sabia ler... Ah, ele ainda é um menino de 21 anos. )
Mas o amor sem bordas é dissimulado... Fala que ama, mas não diz. Faz parte de sua magia querer ser lido nas entrelinhas. E inaugura então o idioma do sorriso. O amor sem bordas diz “eu te amo” quando ri. Então para entender o amor sem bordas alguém terá que saber ler sorrisos? Não, você pode também não entender. Ele não faz a mínima questão de ser entendido. Ele é poliglota! Fala em tatibitate também. Não que ele não tenha seu orgulho, tem sim, ora, sendo sua razão amar, o amor sem bordas quer ser reconhecido sim, ter seus minutos de fama no brilho do olhar de quem o captou.
É como um golfinho. Belo e escorregadio. Muito engraçado e adora criança. Mas esconde uma certa tristeza sim... Lá num cantinho da alma de quem ama o amor sem bordas há uma tristeza distraída ( e que fique assim por muito tempo! ) E, de repente, a gente se percebe mais paciente e calmo. Mais assíduo. Mais responsável. Bem mais cidadão. A gente se percebe mais inteiro. Feliz como golfinho e não como gente.
O amor sem bordas embora ressoe em todo coração que encontre, é egoísta, ama primeiro a si mesmo. O amor sem bordas sabe que é a única forma de amar, mesmo assim, deixa os meninos brincarem dizendo que amam; é tão bonito ouvir falar de amor... Mas eu ainda não me declarei ( ou já? ). Isto não faz nenhuma diferença. Não vou deixar de amar.
O amor sem bordas morre de medo de dar certo. Ele sabe que é correspondido, só não quer admitir. Tão simplesinho. E vai assim... Passando dias e dias. O amor sem bordas não quer nunca acabar. ( Eu adoro o jeito dele falar, amo cada monossílabo, cada respiração...) Quem pode imaginar o quantum do amor sem bordas? Quase uma heresia...
O amor sem bordas acredita no poder da palavra. É como um senhor alto, magro, de chapéu e um bocado de idealismo, sempre com uma frase gentil... O amor sem bordas é a cara de Gentileza! É também um adolescente de boné que rabisca versos no caderno que jamais teve coragem de mostrar para a menina de óculos ocultando os olhos, agasalho escondendo o corpo e tantos outros versos que jamais teve coragem de mostrar para o adolescente de boné.
O amor sem bordas ama sem olhar para os lados, pois não se importa de ser visto, embora a miopia reinante lhe permita certa clandestinidade. O amor sem bordas fala palavras obscenas. Ele desconhece tabus.
Não que seja vanguardista. De fato, é um conservador. Estabelece uma nova ordem para sempre insubstituível: Amar sem bordas. Daí emana seu aspecto revolucionário... Nada será como foi. ( Mas eu preciso levantar agora.... Lá fora cai uma chuva forte e tão escuro está o céu, que eu quero ver a chuva, costurar no tempo, imaginando como seria ele aos dez anos de idade chateado por uma chuva como esta lhe impedir de ir jogar futebol. E dormir um bom pedaço do dia também.

Alyne Costa
Março de 2001

Monday, May 09, 2011

Hora de Um Café



E uma absurda felicidade me invadira com o frio daquela manhã. Morava no cinza daquelas nuvens. No rádio que alternava notícias e canções que eu não dava muita importância porque fazia um absurdo silêncio em mim...
E enquanto o silêncio reinava eu sentia fome e tive vontade de um café que não veio porque eu tinha preguiça de me desgrudar da coberta. Queria abraçá-la assim pelo resto do dia, deixando na mente reinar fantasia.
O telefone tocou, mas quando atendi a ligação caiu e não havia como retornar porque era um número não identificado e nada importava porque eu também não me lembrava qual era a data nem que dia da semana. Não tinha mesmo nenhum compromisso.
E nem mesmo aquela preguiça e sua felicidade eu precisava identificar porque nenhuma palavra a traduziria, talvez alguma canção, um hino ou recordação de infância...
E entre tanto dormir e acordar eu acabei sonhando com maçãs do amor coloridas o que me trouxe de novo uma fome diferente de nada que existia na cozinha.
Era uma espécie de orgasmo sem macho, de parto sem filho e nem se pode chamar de felicidade clandestina porque de tão legítima eu me dava alforria.
O rádio insistia em aumentar os devaneios quando tocou o interfone e o homem do gás me lembrou que já era mesmo hora de um café.
Alyne Costa
9/05/11

Thursday, May 05, 2011

Trilha do Poeta


Foto retirada do Blog http://malucosevagabundos.blogspot.com

O caminho do poeta é trilha repleta de incerteza.
E vem recheado de tristeza.
E lágrimas do coração.
É um caminho de quem vai sozinho levando no peito a multidão.
E um caminho que sonha o sonho de toda gente.
De ver mundo diferente, fim de guerras e escravidão.
Um sonho que vara a madrugada por aquele que segura a enxada...
E mata a fome da nação.
O caminho do poeta é rio em correnteza...
E querer fartura na mesa de cada um seu irmão.
É ver poesia na alfabetização.
O caminho por poeta vai por tortuosas ruas.
Segue em alamedas nuas em busca de compreensão.
Com seu canto vagabundo sonhando em ver o mundo de uma vez dar as mãos.
Dirão uns que ele delira.
Dirão outros de nada valer tanta ilusão.
Mas em seu peito triste:
Um profundo amor resiste e do sonho não abre mão.

Alyne Costa
5/05/11

Monday, May 02, 2011

Sobra de Alegria


Anjo da Melodia, Acrílica sobre Canson, Alyne Costa, abril de 2011

Seu amor me encontraria mesmo se mudasse o endereço.
Inteira.
Ainda revirada ao avesso.
Mesmo arrombada a porta.
O sangue pulsando na aorta.
Esse querer que é meu ritmo sublime.
Já tem a fragância do meu perfume.
Já me arrancou as algemas.
Já queimou todos os meus poemas.
Eu já virei colibri.
Ganhei asas e parti.
Dancei entre outras flores.
Celebrei outros amores que não mais habitam em mim.
Cubro-me em noite fria com a colcha de retalhos da alegria.
Aquela que guardei pra mim.

Alyne Costa
2/05/11

Saturday, April 30, 2011

Estrela Guia



Aprendi já tarde a lidar com urgências.
É que sentimentos não se encontram em lojinhas de conveniência...
Ontem meu amor e eu misturamos as lágrimas.
Pude então entender a vastidão da compreensão.
Não fui feita para pressa, nem desespero.
Fui moldada para ter esperança.
E quando ela não chega, me encolho.
Agasalhada, leio os novos poetas...
Novas direções, tantas setas.
Sigo-os em busca do sol.
A minha veia matriz germina sonhos em pedacinhos de algodão.
Lembro da resignação de meus avós.
Da fé, da honestidade e das relações de compadre e comadre.
O respeito por quem tinha estudo.
E qualquer assombro levava-se a dizer: “Misericórdia.”
A vida que levou minha inocência, levou também meus assombros.
Serei eu a poeta dos escombros?
Cantarei o que sobrou?
Não, tenho a esperança que me inunda os olhos.
Tenho o condão do perdão.
E a poesia como estrela guia.

Alyne Costa
30/04/11

Wednesday, April 27, 2011

O Sonho É Meu



Sonho em dançar um tango...
Em deixar este amor totalmente nú.
Em deixar as contas totalmente às avessas.
Faço promessas pra abandonar os vícios.
Mas são eles que por obséquio não me deixam.
São resquícios de pó de pemba.
Arrumo a mesa.
Preparo um arranjo com frutas frescas.
Acendo um incenso de sândalo e olho ,admirada, enquanto a janta cozinha na panela.
Volto à cozinha e confiro.
Quase pronto o ritual, me dispo e me banho, antes uma canção.
Fracoise Hardy.
Enquanto luto contra os ponteiros do relógio, me perfumo...
E entre uns goles de vinho e tragadas no cigarro, chacoalho o tapete da sala.
Tudo deve estar pronto.
Apago as luzes.
Acendo as velas.
Um pouco de bom ar, ele não fuma...
Minha boca se espuma sorvendo de desejo.
Sonhando em dançar tango.
De salto, na corda bamba do imprevisto, eu quase desisto quando o interfone toca.
Fechem as cortinas.
O sonho é meu.

Alyne Costa
27/04/11

Tuesday, April 26, 2011

Quem Não Aprende Com a História...


Foto retirada do site http://fatosemcharges.wordpress.com/2008/10/24/foto-el-pais-convencao-internacional-de-palhacos/


Tava meio cansada de ter tanta memória. A minha paixão por detalhe me põe em riscos. Porque lembro de coisas recentes e coisas de décadas atrás recheadas de detalhes. Isso pode ser uma espécie de loucura, não sei.
O mais terrível é que você convive com pessoas que não possuem a mesma memória, máxime porque costumam se lembrar dos fatos da forma como lhe são convenientes... Daí você fica ouvindo a história toda deturpada se corroendo, deixando o narrador ir longe na fantasia com medo de interferir e horrorizada da potencialidade humana de tecer tramas para se tornar vítimas.
Antes eu interferia, dizia não foi nada disso, mas como sempre dava com os burros n’água, desisti. Viva cada um com seu delírio.
Recentemente encontrei minha primeira professora no Facebook. Lembrava detalhes dela, da escola, da turma, dos colegas e das músicas que ouvíamos. Eu devia ter de três para quatro anos quando fui sua aluna.
Pena que a gente nem sempre seleciona o que fica gravado na memória. Há coisas que é melhor esquecer, mas a gente volta e meia lembra. Deve ser mecanismo da vida. Memória boa: Meu professor de história do 2º Ano dizendo: “ Quem não aprende com a História, está condenado a repeti-la.”
Não lembro todos os meus poemas decorados, mas lembro todos os quem beijei...
Lembro muito da minha infância. Do cheiro de boneca nova, dos vestidinhos de retalho, das brincadeiras no terreiro da casa de minha avó, dos circos armados onde eu sempre queria ser o palhaço e da única palmada que levei de meu pai.
Lembranças são como guloseimas, pena que não caibam em gavetas.

Alyne Costa
26/04/11

Velhos e Jovens (Arnaldo Antunes)

Antes de mim vieram os velhos
Os jovens vieram depois de mim
E estamos todos aqui
No meio do caminho dessa vida
Vinda antes de nós
E estamos todos a sós
No meio do caminho dessa vida
E estamos todos no meio
Quem chegou e quem faz tempo que veio
Ninguém no início ou no fim
Antes de mim
Vieram os velhos
Os jovens vieram depois de mim

Friday, April 22, 2011

Nossos Homens Não Foram à Guerra



Ouçam bem minhas amigas.
Nossos homens não foram à guerra, mas estão todos perdidos.
Precisam do nosso colo.
Da doçura fêmea de nossas mãos...
Do cheiro de toalha limpa e sabonete novo.
O poder nos cai bem.
Fomos feitas para gerar e quando queremos damos ao mundo os guerreiros.
Aprendemos a pegar em armas que sequer precisamos usar.
Somos fadas, santas, bruxas e loucas.
Entendidas de dor.
Nos deram manuais, livros de receitas, livros de como cuidar do bebê, romances...
Mas de vida, aprendemos sozinhas.
De conquistas, aprendemos quando demos as mãos.
Somos feiticeiras, detetives, ciganas e bailarinas.
Rasgamos os manuais.
Nossos homens não foram à guerra, mas estão todos perdidos.
Profunda é a paixão.

Alyne Costa
22/04/11

Wednesday, April 20, 2011

Quando a Vida Requer Pausa



Tenho natureza melancólica, mas nem por isso a alegria não deixa me visitar e quando isto ocorre banho-me na chuva.

Tenho paixão por detalhes, miudezas não me passam em vão. Silhuetas, olhares, afagos de gestos e palavras me transmitem muito tanto quanto os sonetos de Florbela Espanca, os filmes de Almodóvar e a voz de Nara Leão.

Acredito que fomos feitos para passar pela vida e não a vida feita para passar por nós. Por isso ela às vezes nos requer pausas. Quando entramos na dinâmica louca da vida sem dar a devida atenção às nossas reais necessidades ela nos quebra literalmente porque tentamos ser aquilo que não somos: máquinas.

Aí adoecemos sob diversas formas, deprimimos,entramos em pânico, machucamos quem menos gostaríamos de ter machucado, somos surpreendidos pelas mais variadas espécies de desenganos, fazemos uma besteira enorme e temos que precisar parar tudo para consertar o que talvez nem tenha mais remendo. Achamos que estamos enlouquecendo e que não vamos conseguir suportar a profundidade daquela dor. Tudo isso porque deixamos que a vida passasse por nós, sufocando nossas emoções e reais desejos, subestimando nossos talentos e potencialidades, olvidando nossa espiritualidade e não dando atenção à nossa condição humana que requisita pausas.

Quando a vida nos obriga a parar, observamos que são necessárias mudanças. Nem sempre temos por perto os braços que gostaríamos que nos abraçassem, mas precisamos sobreviver...Temos nossos próprios braços que podem envolver-nos num abraço, temos nossas próprias mãos que podem preparar um chá e escrever. E mais, temos uma poção mágica: nossa imaginação! Essa pausa é, principalmente , um reencontro consigo mesmo.

Se você não falar nada provavelmente ninguém perceberá o que está ocorrendo. Porque a grande maioria das pessoas também está assim, deixando a vida passar por elas. E não é falta de solidariedade é que se as pessoas não estão conseguindo dimensionar o que acontece com elas como poderão compreender o que ocorre com os outros?

E enquanto você é uma lagarta o mundo te enxerga como uma linda borboleta colorida dando rodopios no jardim.

Essa pausa é sua. É necessária para que você passe pela metamorfose de lagarta e se torne de fato uma linda borboleta. Não é momento para ler os jornais ou livros técnicos, se cuidar também exige qualidade naquilo que lê, vê e ouve. Nessa pausa você está passando pela vida e é preciso buscar leituras agradáveis, apreciar belas mandalas e preparar um retorno em que se sentirá mais livre e seguro.

Quando você passa pela vida você observa o canto dos pássaros, beija-flores costumam lhe visitar, com casa e alma arejadas sobra espaço pros anjos chegarem com seus sinais. As coisas fluem num ritmo de acordo com suas reais necessidades. E então você descobre que importa ser aquilo que é e não o que gostariam que você fosse.

Alyne Costa
20/04/11

Monday, April 18, 2011

O Filme Que Eu Vi Ontem A Noite


Fotografia retirada do blog http://abrigodeventos.blogspot.com

Em seu corpo retalhos de uma guerra.
Cicatrizes na alma.
Aprendera a amá-lo enquanto fazia curativos sobre suas queimaduras.
Pouco falava.
Lembranças do horror haviam levado a escolher a solidão.
Ele aos poucos esculpia na muralha de gelo que a contornava uma flor.
E contou que não sabia nadar por pavor a monstros marinhos imaginários.
Parei o filme.
Um café. Um cigarro. Os remédios homeopáticos.
Lembrei de um tempo que eu gostava de roda gigante e de soltar bolas de sabão.
A inocência sublimava os temores.
Nunca devemos deixar que as marcas de qualquer terror matem uma possibilidade de amor.
Liguei o filme.
O amor nascia numa plataforma de petróleo.
Ele precisou ir para o hospital e ela fugiu.
Fugiu para seu trabalho, seu mundo e sua dor. Fugiu do amor.
Obstinado, ele a encontra e revela seus desejos.
Não havia mais como fugir, o amor havia cercado por todos os lados.
Foram felizes...
Stop.

Alyne Costa
18/04/11

Saturday, April 16, 2011

O Sol



Entre o meio e o todo : o inefável!
Entre a sombra e a meia-luz : o sol!
Entre o maldito e o indecifrável: a verdade!

Alyne Costa
16/04-2011

Friday, April 15, 2011

Quando a Loucura Me Visita



Fotografia retirada do site http://www.arvores.brasil.nom.br/florin/oiti.htm


O meu ofício não é o de mulher educada
Trago em mim as chagas das Helenas
Romperam-se as minhas comportas
E tudo sangra, gota a gota
Sentidos e sofrimentos
Tudo escorre pelos dedos trêmulos de minhas mãos.
Nas madrugadas enquanto todos dormem eu visito a cidade.
Numa solitária astronave cor de maçã.
Vejo os sem-teto, as damas da rua e os vigilantes da lua.
E quando não há lua é só tristeza.
Preparo a comida como se faz feitiço.
Gosto do cheiro dos temperos que por vezes se misturam às lágrimas.
Não, o meu ofício não é o de moça comportada.
É o da mulher que chora em dores de parto as injustiças do mundo.
Qualquer equilíbrio me desconfigura...
A minha loucura avisa de véspera suas visitas.
Abro todas as cortinas, lavo a louça, acendo incensos.
Bordo pequenas alegrias em lençóis alvos.
Para recebê-la me visto de diva.
Conversamos, vamos ao cinema, ouvimos canções francesas...
Abrimos um vinho, embriagadas rimos alto daquilo que até mesmo não tem graça.
Choramos copiosamente pelo que nada podemos fazer.
Adormeço no seu colo.
Acordo com o bem-te-vi cantarolando no pé de oiti.
Alyne Costa
15/04/11

Friday, March 25, 2011

Aulas Regadas a Dodô e Osmar



Lembro com saudades dos meus livros de infância. Aqueles de colégio que traziam fragmentos de histórias da Ruth Rocha, da Henriqueta Lisboa e poemas de Cecília Meireles. Não lembro que autor mas nunca esqueço a história de Raquel e sua bolsa, a de uma gatinha que se chamava Face Branca Murmurante e de um livro do Pedro Bloch que contava a história de um menino daltônico intitulado: “Pai, me compra um amigo?”

Era ávida por literatura. Nas férias escolares devorava os livrinhos de literatura infantil que a escola pedia e que não dava tempo durante o ano letivo de trabalhar na sala de aula. Frequentava bibliotecas e lia de Monteiro Lobato a lendas sobre o folclore brasileiro.

Certa ocasião chegou um grande navio em Salvador e meu pai me presenteou com um livro chamado “Rosinha Chinesa” que nada mais era que uma versão oriental da cinderela... Eu queria morar naquele navio.

No início da adolescência: Pollyana, Christiane F, Coleção Vaga-Lume com os enigmas de Marcos Rey, daí cismei que ia ser detetive.

Um pouco mais tarde Hermann Hesse: Demian, O Lobo da Estepe, Sidarta.
Fui me aprofundo até chegar em Marcuse, Nieztche e Foucault já com 19 anos.

Eu lia e gostava de quem lia. Assim ensinei Maria a ler. Maria havia chegado lá em casa de uma roça chamada Alecrim e ainda não era alfabetizada. Com o dinheiro da merenda comprei caderno, lápis, borracha, lápis de cor e até um caderno de caligrafia, além de uma cartilha e comecei o ofício de magistério.

Maria não podia mais ver a novela da tarde. Eu era rabugenta e exigentíssima e de vez em quando Maria não queria aula. Frustrada, eu amenizava, dava recreio antes da hora, colocava um LP do trio elétrico Dodô e Osmar e a aula acabava em carnaval.
Os dias se passavam e aos poucos eu vi minha vitória, Maria já assinava: Maria Lindóia da Conceição.

No ano seguinte estava matriculada numa escola noturna. Confesso que fiquei um pouco triste ao ver Maria ir para uma escola de verdade e sair da escola de meus sonhos.
Viva Dodô e Osmar!

Alyne Costa
25/03/11

Thursday, February 17, 2011

De Tudo Que Quero Bem




Gosto de gente de pés descalços, sujos da lama da vida...
De ver o arco-íris quando aparece no céu.
Dos sem teto, dos sem lei, dos sem informação...
Gosto dos idosos e dos loucos de todo gênero.
Dos esquecidos nos leitos dos hospitais...
Gosto do meu Amor, do meu filho, das minhas vizinhas.
Dos vendedores de café... E seus carrinhos coloridos.
Do art. 5 da Constituição...
Gosto do Lula e do Saramago...
De tudo que vibra e transforma.
De toda espécie de dança que alguns chamam de Esperança...
Gosto dos que acordam cedo para comprar pão.
Gosto dos que acordam tarde pra fazer canção.
Gosto de desafios e incertezas...
Gosto de Miguel Carneiro e de Bemvindo Sequeira...
De gente que fala sério, mas que também diz asneira.
Mas que faz poesia e um reino de fantasia.
E que faz desse Brasil a terra da alegria!

Alyne Costa
17/02/11

Wednesday, February 16, 2011

Para Entender O Porquê de Alguns Partirem Cedo...



Vivemos incansavelmente, nos entregamos plenamente, amamos, nos expomos, achamos que já choramos tudo, que já estamos prontos, que a vida já nos armou tudo que tinha para armar...
Que estamos prontos, aptos, amadurecidos, retadões, que a parcela do bem diário está em dia, que a cada dia que o sol brilha recomeçamos melhor, que já agradecemos a Deus o suficiente por nossos talentos e virtudes, que já pedimos perdão aos irmãos de jornadas por não sermos perfeitos dado que falíveis e humanos...
Julgamos já ter dito eu te amo o suficiente, ter entendido o quão complexa é nossa cadeia de relações e assim compreendemos que aqueles que mais nos criticam podem estar socialmente mais adoentados do que nós, e, pior, nem terem se dado conta disso. E na sua frágil inocência nos ferem e abandonam no nosso pior momento. E nós que já nos demos conta do nosso “estado” temos a obrigação de perdoar, compreender e sobreviver, por mais que esta tarefa não seja doce e fácil é, sem dúvidas, o caminho...
Nós, os sabichões que nos julgamos paus pra toda obra e que já passamos por todas as experiências dolorosas e de alegria possíveis. No fundo, não vimos e nem sabemos de nada. Não abrimos as janelas pros beija-flores, não rasgamos os peitos pra todos os amores, não sabemos e nunca estaremos preparados pros mistérios dessa vida.
As pessoas mais doces da nossa existência são nos tirada de uma pressa e brevidade estonteantes. Vão-se levemente como os pássaros, com asas de anjos deixando nossos braços vazios do seu abraço, nosso ouvido surdo de sua doce voz com palavras quase sempre certeiras para atingir o coração. Não nos dão oportunidade de despedidas para deixar em nossas as almas a sensação de eternidade.
Pessoas que viveram dignamente sua existência, que se doaram, que nos deixaram mudos, sem saber o que pensar, envoltos numa nuvem imensa de saudade...
Nesse mundo estranho em que muitos perdem o equilíbrio numa briga de trânsito, disparam estrondosas buzinas na mais absoluta desnecessidade, se agridem pelo mínimo, esses anjos que desfilaram e cedo se foram parece que desde cedo sabiam que dinheiro não se come, vai e vem... E com sua arte tocaram nossas vidas, tornando-as mais leves e sublimes, completando cedo suas missões.
É muito fácil aprender a amá-los, difícil é conviver com a falta que faz, com a sensação que não estamos ainda prontos.
Restam canções martelando a alma. “A gente não quer só comida, a gente quer comida diversão e arte... A gente não quer só prazer, a gente quer prazer pra aliviar a dor...”

Alyne Costa, 16/02/11
Para Neyvan Cruz

Tuesday, February 08, 2011

Qualquer coisa eu chamo a menininha...



Haviam palavras indecisas naquele silêncio forçado. Era a mulher que lavava a louça enquanto ouvia jazz, mas ainda era a menininha que olhava os ladrilhos cerceando os detalhes e procurando formigas.
Seu medo morava em maçãs vermelhas perfumadas. Morava nas panelas inoxidáveis que agora brilhavam. Nas garrafas de vinho vazias, agora empilhadas num cantinho da área de serviço e que, cúmplices, não revelavam seus segredos e até pareciam namoradas das diversas carteiras de cigarros vazias.
Ameixas podres lamentavam não terem se transformado em geléia enquanto as contas chegavam vigorosas sob o tapete da sala trazendo mais transtorno e latas de cerveja que vazias enchiam o lixeiro e assustavam a moça da portaria.
Enquanto o caos parecia bailar o adolescente ruidoso jogava em seu computador noites a fio e gargalhadas assombravam a vizinhança, ao passo que a menininha procurava dar contorno com sua ternura como se doçura pagasse contas.
A menininha descia a praça e suas mãozinhas deslizavam suaves pelas paredes e de vez em quando mais um ladrilho, uma ou outra formiguinha solitária e esquisita. Os pratos todos limpos, os raros copos, as canecas de sopa e de café. O marido que esperava o trânsito desafogar sentiria alivio? Passaria pelo supermercado e traria uma pizza. Sentariam à mesa e esperariam crédulos que o amor não morresse.
A menininha esconderia triste sua decepção pelo saco de jujubas que nunca vinha. Se esconderia num cantinho e a mulher assombrada desligaria a TV na hora do telejornal.
Leria um poema de Cora Coralina, tomaria um pouco de café, olharia mais uma vez o abandono do aquário indignada da sobrevivência dos peixes e até esqueceria da tristeza após o cansaço da casa limpa.
Agora todos os dias seriam assim, dias de limpar a casa e de lavar a alma. Qualquer ameaça de tristeza, eu chamo a menininha...

Saturday, February 05, 2011

Os Quatro Olhos da Escuridão



Os quatro olhos da escuridão me abraçam
Os quatro olhos da escuridão observam meus trôpegos passos
Enquanto dura a espera, a vida se esvai...
O meu cigarro amigo faz cena de me dar abrigo.
Mas meu amor é imenso e não sente culpa.
Anjos coloridos levaram embora meu medo.
Mora no tremor das minhas mãos um chão de incertezas.
E, minh’alma docemente áspera trafega em torrentes de dúvidas.
Sou fêmea e ao passo que envelheço, enloqueço.
E, assim, cresço, numa imensidão sem fim...
Falo dialetos incompreensíveis.
Vejo gnomos em jardins que não existem.
A minha tristeza usa sapatilha e cobra caro sua existência.
A minha tristeza dança em torno de mim.
A minha tristeza se embriaga de perfume vagabundo.
Passeia pela rua com cachorrinho enfeitado de salão.
Esquece a beleza das fotos de Sebastião Salgado.
A minha tristeza não lê jornais, nem vai ao dentista.
Não tem irmão, prima, tio ou avó.
A minha tristeza nunca leu Hermann Hesse.
Não conhece o princípio da dignidade da pessoa humana.
É déspota e tirana.
Não sente fome, sede, frio ou calor.
Não atende telefonemas, não escreve cartas de amor...
Já lhe fechei a porta, mas adentra as janelas.
Rasgou o passaporte.
Me disse que não vai.
Eu que não sei fazer samba...
Apenas pergunto o que será de mim?

Alyne Costa
5/02/11

Monday, January 24, 2011

Amália, Dilma e a Janela


Tava cansada de olhar para aquela janela. Aquela mulher pálida e aquela cicatriz q eu via à distância e minhas brincadeiras de adivinhações.
O que foi isto?
O que terá sido?
Acidente?
Facada?
Assalto?
Marido ciumento?
Amante do marido?
E ela lá... Devia ter também seu enredo para minha vida. Devia saber de cor as cores das minhas calçolas. Minhas intimidades todas. Se assistisse novela, capaz de ter um imaginário bem fértil que lhe desse asas de me achar qualquer coisa: puta, sapatão, maconheira, traficante, e bota coisa no imaginário dela!
O adesivo de Dilma na janela me denunciava.
Deve já ter feito três abortos.
Ainda lembro o dia que me viu voltar da missa e o olhar escandalizado:
-Na missa?!?!
-Sim, na missa, lá na capela...
Olhou-me fixamente e deslizou os olhos pela vestimenta de meu companheiro, como se ganhando fôlego para, enfim, afirmar:
-Padre Napoleão não gosta da Dilma!
-É, eu sei, mas Jesus gosta!
Olhou, meio tensa, procurando conversa pra puxar e eu doida pra saber da cicatriz...
Não agüentei e acendi um cigarro, ainda com o gosto de hóstia na boca. Estava em jejum.
-Você fuma demais. Olha, perdi meu marido assim. Fumava que nem um capeta. Até que um dia não levantou mais. E eu fiquei aqui ao Deus dará, nem pensão recebo...
Pela fresta da porta vi que ela possuía um belíssimo oratório e tive vontade ver...
Pedi água.
Mas não chegou sequer a abrir a porta.
Meio tímida balbuciou:
-Você entende de pensão? De aposentadoria?
Eu que não estudei previdenciário na Universidade só lembrei de Alan. Ai, Alan, você sempre me salva nessas horas...
-Nâo, mas tenho um amigo que entende e muito. Ele trabalha no INSS.
-Será que você não pode me ajudar na minha pensão. Eu também vou votar na Dilma. Acho uma bobagem essas coisas que estão falando dela.
-Sâo, bobagens mesmo! Misturam política com religião, virou um sarapatel...
-Você gosta de sarapatel?
-Eu adoro sarapatel!
-Almoça aqui hoje!
E sarapatel pra cá, cerveja pra lá, Dilminha 13, pensões do INSS, descobri que a cicatriz foi um acidente de infância...
O papo rolou até às 22 h da noite.
Dona Amália virou a maior Dilmista, tal qual Jesus gostaria que o fosse!


Alyne Costa
Janeiro de 2011

Saturday, January 22, 2011

Façamos amor, mas façamos arte!



Volpi


O contato do ser humano com uma obra de arte, faz emergir um novo ser. Ninguém é intangível à arte em suas diversificadas formas de manifestação.

Não é vista apenas pelo olhar, mas pelos sentidos, captada, ainda que indiscernível, abre fendas, labaredas em todos que com ela se deparam. Cegos, crianças, fanáticos, "loucos", "mutilados morais", se o olho vê a arte, vai além.

Segundo o artista plástico Almandrade: "a arte produz efeitos imprevisíveis e é preciso entende-la sem descreve-la". E quem se atreveria a equacionar o seu alcance? A obra de arte transbora a pré-intenção do artista, reflete no espectador, transformando-o num homem novo. Quantas vezes não mudamos, não alteramos as nossas perspectivas perante relacionamentos e fatos após ouvirmos uma canção? E a mesma canção pode nos trazer leituras diferentes acerca da mesma realidade.

Não pretendendo adentrar no "mito da incompreensibilidade" da arte e sim a necessidade de utiliza-la como fato social propulsor de uma nova ordem: Se o homem muda com a arte, esta transforma o mundo!

O mundo moderno e suas neuroses tem na arte a sua mais sadia forma de profilaxia. Todos nós precisamos de angústias, crises existenciais, temores e fobias. Precisamos tanto que às vezes criamos problemas onde não existem. Precisamos de uma certa dose de loucura para que a vida não se torne morna ou sem sentido. Sem sofrimento qual paixão humana nos afundaria para que aprendêssemos a voltar à superfície novos, experientes, mais ternos e mais humanos?

Assim, amados, consumam menos drogas e mais arte!

"Poetas, seresteiros, cancioneiros, ouvis..."

A arte é a veia aberta da verdadeira revolução. E o artista? É todo aquele que aprendeu que a criatividade, da Ecologia à Bio-Medicina é a grande "sacada" para a nossa convivência "sustentável".

Segundo Miguel Torga: "De quantos ofícios há no mundo, o mais belo e o mais trágico é o de criar arte. É ele o único onde um dia não pode ser igual ao que passou. O artista tem uma condenação. E o dom de nunca poder automatizar a mão, o gosto, a enxada. Quando deixar de descobrir, de sofrer a dúvida, de caminhar na incerteza e no desespero, está perdido."
Assim, somos neuróticos, desesperados, sedentos de coisas novas, apavorados, inseguros, mas duvidamos. Sim, duvidamos! E alguém se lembra de que mesmo a dúvida é o preço?

Portanto, amados, não somos canhões, somos canários...

E façamos carinhos com nossos cantos, façamos amor com a intensidade dos nossos desejos, mas façamos arte com nosso suor!

Alyne Costa

Monday, January 10, 2011

Coral de Carolina



Haveria debruçada em alguma janela Carolina como ela?
Carol mais Carolina que aquela?
Fez do mundo sua janela e pulando fora dela criou nossa primavera...
Arde em Carolina a beleza da sã rebeldia
De quem veio para o mundo pra fazer estripulia
Vestindo de sabores sua fantasia
Alcança como quem dança a arte da sabedoria

Pára a natureza no olhar de Carolina
Onda do mar, mergulho de piscina
Suco de caju, beijo na surdina

Carolina temperança, tempestade e confusão
Carolina a vida ensina a ter mais compaixão
Pois o dia em teu sorriso arrebata um coração
Carolina flor menina adolescendo com paixão

Carolina que rastafarizou sua trança
Carolina que balançou o surfista na prancha
Saiu do colégio pela contra-mão
Fugiu do mudinho lá da Cruz da Redenção

Carol, caroca, cocora
Pula qual pipoca
Carol do Acupe, da gameleira, de itacimirim
Mas sempre Loly, coca-cola com quindim.

Alyne Costa