Friday, February 29, 2008

De Amarrar

Dame avec éventail, Klimt, 1917-18


Há os que vivem sem pressa alguma, sem dúvidas, sem angústias, sem assombros e pautados no óbvio.

Para estes, ócio ou deleite, raivas, inconstâncias, temores e paixões são nuances de desequilíbrio. Esqueçam essa louca! A louca que sobrevoar a praça nua em pelo numa vassoura de cipó e assoviar: Ai deu saudade...

A tereré quer lamber a vida que é dela, como só ela sente a profundidade de suas dores.

“A dor é minha e de mais ninguém”.

Egoísta essa maluca, não? Ultra!

Eta, menina doida! Faz todo mundo rir! Por isso é bom ter a doida por perto: É riso certo!

“Mais doido é quem me diz... E não é feliz... Não é feliz...”

O sabor da vida não é único. Ela não me aparece num buffet de sorvetes. Hoje eu quero alegria, amanhã saudade, terça que vem coerência, no comecinho do mês duas bolas de audácia.

O sabor da vida está no improviso, no riso sem sentido, na lágrima que desaba sem vergonha como que falando: Ei, eu vivo! Eu sinto! Eu caminho em passos tortos, nem sempre sobre saltos, nem sempre sobre calçadas, verdade... Eu caminho e muitas vezes não há piso!

Só me resta inventar asas... E voar.

E, assim, ontem bordei um vestido com cores do absurdo. Com pedras e conchas do mar. Travei batalhas com o que não mais me habita e insiste em visitar-me inoportunamente. Acariciei a face da esperança que renasceu no eclipse lunar. Ao deitar-me chamei ao meu coração toda a força que me move. E pensei nos radares, nos monitores, nos dedos em riste e em todas as posturas convenientes...

Pensei na expressão: Loja de Conveniências.

Hoje quase tudo se vende e é comprado. À vista, parcelado no cartão, com cheque... Quase tudo.

Uma adolescente de sandálias de prata e cheiro de brisa me avisou: Não é errado falar bassoura, barrer, prumode, prefume...

E pensei que os gênios às vezes se transformam em fadas e sussurram verdades profundas.

A gente tem é que se permitir.

Originalidade, meu preto, isso aí é que ninguém compra...

Enquanto desfilo meu vestido nas alamedas que ninguém mais vê, vou aprendendo com esses meninos que crescem...

Ninguém no mundo está terminado... Nada é do jeito certo.

Ainda faltam no meu vestido uns bordados com um capim que vem do Tocantins.

E porque muitas vezes me assombro é preciso que alguns me evitem para que eu não extraia a dedo seus furúnculos.

Poesia é anestesia.


Alyne Costa

Salvador 28 de fevereiro de 2008

3 comments:

Anonymous said...

poesia tambem é estimulante;
guerra e suja;
entorpecente.
poesia pode tambem ei desprezo;
dor
e principalmente poesia pode ser amor.

Jorge Elias said...

Passei para uma nova visita.

Deixei um beijo anestésico em meu Blog.

Abraços,

Jorge Elias

Luciano Fraga said...

Cafundó,bravo,poesia é tudo!É cura para toda dor,abração.